Richie Ramone: ‘Os Ramones não queriam o Marky de volta’

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Richie Ramone esteve no Brasil com sua nova turnê para promover o recente álbum “Cellophane”. Na última semana, ainda em São Paulo, o baterista conversou com exclusividade com o Ligado à Música. Durante a entrevista, o músico comentou sobre a música “Pretty Poison”, composta na época em que estava nos Ramones e que só foi lançada agora no atual disco.

Richie também relembrou da primeira passagem no Brasil com a lendária banda punk, em 1987, e ainda falou sem rodeios sobre sua saída dos Ramones: “Acho que se eles olhassem para o passado e soubessem que iriam ter Marky de volta na banda, nós teríamos nos acertado”.

O baterista ainda reforçou que gostaria de gravar um álbum com CJ Ramone e sair em turnê com o projeto que o baixista comentou antes conosco (relembre aqui).

Aproveitamos a presença da baixista Clare Misstake para saber da sensação de tocar com dois Ramones. A artista também falou do álbum “Cellophane” e sobre os fãs da América do Sul. Confira a seguir.

LIGADO À MÚSICA: Começando com o seu novo álbum, “Cellophane”. A faixa “Pretty Poison” é uma música que você compôs quando ainda estava nos Ramones, certo?

RICHIE RAMONE: Correto, em 1984.

LIGADO À MÚSICA: E por que vocês não chegaram a lançá-la na época?

RICHIE RAMONE: Bom, nós todos nos juntávamos com as nossas composições e essa acabou não sendo escolhida. Nós não podemos lançar tudo, né? Então agora, anos depois, a banda chegou até mim dizendo que gostavam desse som e eu estava meio “Ah, não sei…”, então o que fizemos foi mudar um pouco da versão original, para torná-la mais atual e rolou bem legal. As pessoas gostaram bastante dessa música, fiquei surpreso. Eu não escolho ela como uma das faixas mais fortes do disco, mas ela soa legal ao vivo.

richie-ramone-cellophaneLIGADO À MÚSICA: Mas já se passaram muitos anos desde que você a escreveu, vocês a alteraram em que sentido?

RICHIE RAMONE: O significado da música continuou o mesmo, falando sobre como é estar em um relacionamento ruim com uma garota venenosa e difícil, como uma modelo por exemplo, entende o que eu quero dizer? [risos]. Elas são bem difíceis de manter um relacionamento, você me entende, né? Elas custam caro, estão sempre reclamando e nos desgastando [risos]. Então, é sobre isso que a faixa fala. Nós apenas a deixamos mais atual.

LIGADO À MÚSICA: Ainda sobre o novo álbum, vocês fizeram uma versão de “Enjoy the Silence”, do Depeche Mode. De onde surgiu essa ideia?

RICHIE RAMONE: Eu gosto dessa música, gosto bastante. Então nós sentamos e decidimos fazer uma versão mais rock n’ roll, sem os sintetizadores. Nós começamos a mudá-la e, cara, ela soou tão bem. Eu gosto da mensagem da música, como se aqui nos meus braços eu estivesse abraçando todo o mundo [analogia a um trecho da música], nós viemos todos juntos a esse planeta, então essa mensagem significa muito pra mim. Eu ouvi na noite passada lá no clube em que eu estive como DJ que ela soou bem legal, fiquei feliz com isso, eu sempre quis fazer algum cover e é difícil escolher alguma música que não seja uma dos Ramones. É diferente, por exemplo, fazer um cover de “Sheena Is a Punk Rocker” ou alguma do tipo.  Muitas bandas não fazem assim, mas eu acho que quando você faz um cover, você tem que fazê-lo soar de forma que pareça que você que escreveu, entende, como se aquele som fosse seu. Acho que foi isso que eu fiz com essa versão, eu a fiz minha e estou muito feliz com a minha escolha.

LIGADO À MÚSICA: Voltando um pouco para o passado agora. Você esteve aqui no Brasil com os Ramones em 1987. Quais são algumas das memórias que você possui sobre essa passagem no país?

RICHIE RAMONE: Claro, estive sim e tenho ótimas memorias sobre. Acho que foi a primeira vez que estive no Brasil e, cara, o respeito, os fãs, a loucura, eles balançando o ônibus e nos seguindo… nós não podíamos ir a lugar algum sem nos encontrarmos encurralados. É parte da cultura daqui, da religião, vocês nos fazem sentirmos desejados. Isso parte de gerações. Os pais, seus filhos, os filhos de seus filhos, todos pegam exemplos das gerações e frequentam os shows. Talvez já tenham se passado quatro gerações agora, acho que isso vai ser passado pra sempre. É muito bom se sentir tão amado aqui no Brasil,  amado como em nenhum outro lugar, sério.

LIGADO À MÚSICA: Quando CJ Ramone esteve aqui no Brasil pela última vez, ele nos disse que vocês estavam conversando sobre montarem um supergrupo. Isso realmente vai acontecer?

RICHIE RAMONE: Ainda não…

LIGADO À MÚSICA: Talvez em um futuro próximo?

RICHIE RAMONE: Espero que aconteça, seria comigo e com CJ, nós gostaríamos de lançar um álbum ou um EP pelo menos e não apenas sair excursionando por aí. O grupo seria eu, CJ, Ben Weasel, do Screeching Weasel, e Joe Queer, do The Queers.  Acho que seria uma banda bem legal, faríamos um número limitado de shows, não sei… Talvez apenas festivais, talvez alguns shows, 20 ou 25 por ano. Mas nós queremos ter um projeto, não apenas sair em turnê. Queremos gravar algumas faixas. Ao vivo nós poderíamos tocar alguns sons dos Ramones, do The Queers, seria um show bem legal. Todos gostariam de me ver tocando com CJ e essa é a única maneira que eu vejo isso acontecendo. Vamos ver o que acontece, vamos dar um tempo e esperar.

LIGADO À MÚSICA: Isso é bem legal, que bom que não querem apenas sair em turnê e sim lançar um álbum.

RICHIE RAMONE: Sim, nós queremos gravar. Nós precisamos nos juntar pra ver o que rola, mas isso é bem difícil, quer dizer… Joe mora em Atlanta, CJ em Nova Iorque, eu estou em Los Angeles, então nós precisaríamos juntar todo mundo e isso é bem difícil de organizar, precisaríamos alinhar as datas.

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LIGADO À MÚSICA: Olhando para o passado, você se arrepende do momento em que decidiu deixar os Ramones? Digo, talvez você pudesse ter ficado mais alguns anos ou sei lá…

RICHIE RAMONE: Eu não consigo ficar especulando isso. Você apenas tem que continuar a sua vida. Não tenho nenhum arrependimento sobre isso. Nós não conseguimos chegar a um consenso e teve que acontecer. Sei lá… acho que se eles olhassem para o passado e soubessem que iriam ter Marky de volta na banda, nós teríamos nos acertado [risos]. Eles não o queriam de volta… Eles ficaram bem triste quando eu sai, mas eu era jovem e não queria enchimento de saco. Demorou algum tempo para eu ganhar meu respeito de volta, as pessoas não conseguiram entender o que aconteceu, eles pensavam que eu estava bravo, eu não fiquei bravo com isso, foi mais uma decisão de negócios do que qualquer outra coisa. Você tem que ser homem e seguir em frente. Acho que estou seguindo a direção correta. Agora todo mundo já faleceu também e isso é uma questão que eu tenho enfrentado por mais de 30 anos. A única coisa que eu me arrependo é que poderíamos ter escrito mais algumas músicas juntos, mas eu não vou ficar pensando se eu fiz certo ou errado, foi o que aconteceu, então…

LIGADO À MÚSICA: Você foi o único baterista dos Ramones a dividir os vocais com Joey, o que pode nos dizer sobre isso? Como vocês chegaram a essa decisão?

RICHIE RAMONE: Joey me encorajou, ele disse que gostava bastante de me ouvir cantar.

LIGADO À MÚSICA: Então a ideia surgiu a partir de Joey, não foi algo tipo: “Eu quero cantar essa música”.

RICHIE RAMONE: Não, não. Eu não cheguei a me empurrar dessa forma. Sabe, lembro que estávamos no estúdio e ele disse: “Eu quero que você cante ‘Can’t Say Anything Nice’, eu realmente quero”, então nós começamos a cantar juntos em estúdio e em shows, eram dois vocais ao vivo, as performances ficaram bem mais poderosas. Eu acho que todos nós evoluímos juntos, como uma banda. Era um line up bem forte entre 1983 e 1987, nós tocávamos como uma banda de verdade deveria tocar.

LIGADO À MÚSICAPra fecharmos… Então é realmente verdade que você saiu dos Ramones porque não conseguiram chegar a um acerto em relação à sua parte das vendas do merchandising?

RICHIE RAMONE: Sim, uma das coisas que me fez sair foi o merchandising. Johnny e eu não conseguimos chegar a um acerto sobre a minha parte e coisas do tipo. Quatro anos na banda, usando a minha imagem, o meu rosto… Eu tinha que fazer parte de algum degrau daquilo, talvez não com a mesma porcentagem, mas sei lá, metade do que eles pegavam, você me entende? Mas eles não o fizeram, foi uma decisão de negócios. Então, não tem como você ficar, é foda. Eu acho que eles se tocaram ou os avisaram do equívoco que estavam cometendo e eles tentaram fazer de tudo para me manter. No fim eles estavam tipo “ok, vamos tomar mais cuidado com isso” ou “vamos fazer isso ou aquilo”, só que então eu recebi um aviso de uma pessoa, me alertando que Johnny estava dizendo algumas coisas sobre mim e que ele me demitiria depois dos nossos dois shows em Nova York. E então eu decidi que não seria demitido, aquilo me deixou bem nervoso e eu acabei decidindo sair. É foda isso, sabe. Eu acho que nós poderíamos ter tido mais um ou dois bons álbuns. Mas Dee Dee já estava cansado, ele saiu também, na verdade ele queria sair até antes de mim, mas eu o fiz ficar por mais um ano. Ele tinha atitude. Quer dizer, CJ é um grande baixista, vocalista e compositor, mas Dee Dee era uma parte tão importante daquela banda pra mim, ele era o deus de tudo. Que seja, foi assim que aconteceu.

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Confira a seguir a entrevista com a baixista de Richie Ramone, Clare Misstake.

LIGADO À MÚSICA: Qual é a sensação de tocar com os Ramones? Digo, você tocou com Marky e agora toca com Richie, lendas da música.

CLARE MISSTAKE: Sim, cara, isso é incrível. Eu sou uma grande fã de Ramones e estar tocando com Richie foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido. Ele foi o melhor baterista que passou pelos Ramones. Na época era bem legal tocar com o Marky, mas porque eu não sabia que Richie era um baterista tão superior. Eu não gostaria de ter feito o contrário, eu não queria ter começado a tocar com Richie e agora estar junto com Marky, então eu acho que fiz da melhor forma. Comecei tocando com um baterista não tão bom e agora estou com um muito bom.

LIGADO À MÚSICA: E como aconteceu o contato entre vocês? Digo, você já conhecia Marky ou Richie?

CLARE MISSTAKE: Foi com a banda em que eu costumava fazer parte, na Inglaterra. Nós tocamos junto com Marky em 2004, pela Spoken Tour, na qual ele pegava músicos locais para ser a sua banda suporte. Nossa banda foi escolhida, tiramos todos os sons, algo em torno de 20 músicas e fizemos o show, ele disse que havia gostado do jeito que eu tocava. Foi então que em 2008, ele me perguntou se eu não queria fazer parte da sua banda, pois estava querendo um grupo sólido, junto com Michael Graves. Eu fiz isso por algum tempo, até que em 2010, logo quando estávamos para vir para a América do Sul, ele me demitiu e voltar a usar músicos locais, acho que um baixista argentino. Provavelmente porque ele queria tudo para si mesmo, ele não queria pagar os integrantes e então ficava chamando bandas locais para tocar com ele, isso saía muito mais barato. Não vou julgar se isso é certo ou não, foi uma escolha dele. Enfim, depois disso muitos fãs argentinos começaram a entrar em contato comigo, dizendo que estavam bem tristes pois eu não estaria lá com Marky. Foi então que um deles me perguntou se eu conhecia Richie, dizendo que ele morava em Los Angeles e eu realmente não o conhecia. Logo na mesma época, entrei em contato com ele na internet e um tempo depois nós estávamos fazendo algumas jams e tirando alguns sons, foi bem legal, ainda em 2010. Três anos depois, recebi uma ligação dele me perguntando se eu não queria ser a baixista da sua banda, eu respondi: “Ah, ok, né…” [risos]. Algumas vezes as coisas certas deixam para acontecer depois, você planta a semente e só depois de algum tempo você consegue colher. Temos que agarrar essas oportunidades. Eu tentei a minha própria sorte, achei um jeito de entrar em contato com Richie. Temos que tentar, né, você nunca sabe o que pode acontecer, tentar não custa nada, né?

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LIGADO À MÚSICA: Sobre o novo álbum, como funcionou o processo de composição do disco?

CLARE MISSTAKE: Richie escreveu faixas com um monte de pessoas diferentes. Eu até cheguei a escrever uma junto com ele, mas ela não foi escolhida para o álbum. Adam Bones, que toca em Los Angeles também escreveu bastante coisa com Richie. Tivemos a versão de “Pretty Poison”, que ele havia escrito ainda quando estava no Ramones, isso é bem louco, né? Ele chegou a contar pra vocês? Na época ela não foi escolhida para o álbum dos Ramones.

LIGADO À MÚSICA: Sim, nós perguntamos sobre ela pra ele. Além dessa versão, vocês fizeram também uma versão bem legal do Depeche Mode, o que você achou?

CLARE MISSTAKE: Sim, eu amo a banda e essa é uma música legal, nós a deixamos bem pesada. Que legal que vocês gostam deles também e fico feliz que gostaram da versão.

LIGADO À MÚSICA: Bom, pra terminar, em relação ao público daqui, o que você achou? As pessoas costumam dizer que os brasileiros e os argentinos são as duas plateias mais loucas do mundo.

CLARE MISSTAKE: Acho que os argentinos são um pouco mais loucos [risos]. Mas foi bem divertido, todo mundo se divertiu bastante e eu mal posso esperar para voltar.