Rock in Rio: Mötley Crüe se despede da América do Sul em grande estilo
Com espetáculo de pirotecnia, mulheres no palco e uma aula de hard rock, o Mötley Crüe se apresentou pela última vez na América do Sul. O show, que aconteceu no último sábado, 19, fez parte da turnê de despedida “The Final Tour”. Aliás, essa excursão já tem data e local para terminar. A última apresentação dos americanos acontece no dia 31 de dezembro, em Los Angeles, onde tudo começou.
O Mötley Crüe sempre foi uma banda marcada por polêmicas. Em um dos capítulos do “The Dirt”, a memorável biografia do grupo, Vince Neil chega até a se questionar sobre um possível arrependimento durante a trilha de sua vida, marcada por excessos de drogas, mulheres e até mesmo pelo acidente de carro que sofreu, no qual um dos integrantes do Hanoi Rocks faleceu. Alguns trechos depois ele mesmo responde a própria reflexão: “Que se foda”. Amém, Vince! Uma das coisas que mais amamos na banda é justamente a sua história e não seria agora, depois de quase 35 anos de carreira, que deveria se mostrar arrependido de tudo o que já fez. Pelo contrário, nada mais justo do que fechar o ciclo e o legado que começou em 1981.
Todos nós sabíamos que esse dia iria chegar e foi em 2014, mais precisamente no início do ano que o Mötley Crüe anunciou a sua turnê de despedida. Com uma coletiva de imprensa na qual os quatro integrantes apareceram sentados em frente à tumbas de “Descanse em Paz”, o grupo anunciou que a turnê teria duração de dois anos e passaria pelo mundo inteiro, de quebra ainda assinaram um contrato impedindo que a marca “Mötley Crüe” coloque o pé na estrada novamente depois das últimas datas. Se por um lado nos Estados Unidos e Canadá a banda marcou 72 shows, nós da América do Sul ficamos com apenas um, no Rock in Rio, tocando antes do Metallica.
As expectativas para o show não eram das maiores e diversos fatores justificavam o fato. A banda não havia publicado a data do show no site oficial, e quando questionado sobre, Nikki Sixx respondeu que eles eram apenas uma banda de abertura tocando por míseros 60 minutos. Além da resposta desanimadora do baixista, nós já sabíamos que toda a produção de palco que a banda estava usando lá fora não estaria presente aqui no país. Para terminar, o quarteto não ficou nem hospedado no mesmo hotel, deixando uma interrogação sobre qual era clima entre os integrantes nos bastidores da banda. Felizmente, as previsões dos fãs mais pessimistas estavam erradas e a banda se mostrou “redonda” no palco.
Quase que pontualmente, às 22h35, as luzes do palco se apagaram e a música escolhida para introduzir o show começou a rolar. “So Long, Farewell” é um tema do musical “The Sound Of Music” (1959) e possui uma letra que se encaixa perfeitamente no clima de despedida que a banda passa no momento. Assim que finalizado o tema, foi possível enxergar as sombras de Tommy Lee (bateria), Mick Mars (guitarra) e Nikki Sixx (baixo), que se escondiam por trás da névoa que bloqueava parte da visão do palco. Alguns segundos depois, o clássico ronco do motor da motocicleta de “Girls, Girls, Girls” começou a soar e Vince Neil (vocal) entrou correndo, trazendo gritos eufóricos de parte da plateia. Como se não bastasse a escolha do maior hit do grupo como primeira música do show, duas dançarinas subiram ao palco e os efeitos de pirotecnia começaram, dando início a uma aula de hard rock festivo da década de 1980, movido pelo clichê “sexo, drogas e rock and roll”.
Na sequência, a banda tocou “Wild Side”. Na clássica linha introdutória de baixo de “Primal Scream”, Nikki Sixx, como sempre trajado com suas calças rasgadas, bandanas e muita maquiagem, foi até a ponta da passarela e arrancou um coro de “Yeah, Yeah, Yeah” da cidade do rock. Somente no final da terceira música que Vince deu os primeiros cumprimentos ao público. “Como você está, Rio? Vocês estão prontos?”, perguntou o frontman antes de começar a tocar a sua guitarra em “Same Ol’ Situation”, uma das músicas mais bem recebidas pelos mais de 70 mil presentes, com um coro divertidíssimo, coreografia e palmas no refrão com as dançarinas.
Quanto a voz de Vince Neil, não estava das melhores, mas isso não era novidade pra ninguém. Quando o vocalista foi um exímio cantor? Vince sempre foi mediano e olhe lá, nunca conseguiu completar as frases das músicas mas o que o diferenciava de todos os outros era justamente a sua atitude em cima do palco. Sério que alguém estava esperando agudos perfeitos? Se comparado com outros shows, o vocalista até que estava com bastante fôlego e não fez feio. Dando continuidade e trocando a sua guitarra por um violão ovation, Vince trouxe a tona os primeiros acordes da lenta “Don’t Go Away Mad”, para a surpresa de muitos que se encontravam no show.
Antes de “Smokin’ in the Boys Room”, Tommy Lee pediu para a plateia fazer barulho e Vince pediu para que todos levantassem as mãos. Em sequência, vieram “Looks That Kill”, com o tradicional gongo tocando na segunda parte da música, e uma versão de “Anarchy In The Uk”, que animou parte da galera que estava bem morna. Em “Shout at the Devil”, Nikki Sixx acompanhou o marcante riff de Mick Mars com um “baixo lança-chamas”, que usou para incendiar um pentagrama invertido que estava pendurado em seu microfone. Os canhões de fogo que estavam distribuídos pelo palco não foram poupados, sendo acionados quase que durante a música inteira, o calor era sentido pelo público a uns cinquenta metros de distância, um verdadeiro espetáculo.
Antes de dar sequência ao show com “Saints Of Los Angeles”, Mick Mars mostrou que apesar da saúde não estar das melhores, seus solos virtuosos ainda continuam intactos. Já na reta final do show, foi a vez de “Live Wire” levantar a público, sendo seguida pelos clássicos “Dr. Feelgood” e “Kickstart My Heart”. Antes de sair do palco, Nikki Sixx entregou seu baixo para o sortudo fã paraguaio Victor Rivarola. Alguns minutos depois, a banda retornou para encerrar com a balada “Home Sweet Home”, com Tommy Lee no piano. Ao final da música, Vince Neil não se conteve e derramou algumas lágrimas. “Rio, nós vamos sentir saudades”, disse o vocalista antes de desejar boa noite e agradecer a plateia. Enquanto a banda se retirava do palco e aplaudia os fãs, “My Way” do Frank Sinatra foi o tema escolhido para o término do espetáculo.
Apesar do repertório não ter sido tão grande como vem sendo em outros shows da turnê, praticamente todos os clássicos da banda estiveram presentes. James Hetfield e Dee Snider que me perdoem, mas quem roubou a cena desse sábado foi o Mötley Crüe, com uma aula de rock n’ roll de como uma banda deve se comportar em um palco. A banda mostrou que a fórmula exagerada que marcou a década de 1980 ainda funciona e deu um “adeus” em grande estilo aqui no Brasil. Mesmo sendo a última turnê, o grupo não descarta gravar mais algumas músicas juntos, oremos para que isso aconteça.