Miranda sobre o rock atual: ‘Um monte de roqueirinho que só quer ser da Globo’

 

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Foto: Divulgação

O produtor e jornalista Carlos Eduardo Miranda foi um dos grandes responsáveis pelo crescimento do rock nacional na década de 90. Naquele momento, o rock brasileiro criou uma identidade, seguindo seu próprio caminho, sem querer copiar bandas gringas. A partir do selo Banguela, criado por ele junto com os Titãs, novos artistas tiveram seus espaços como foi o caso do Raimundos e Mundo Livre S/A. Miranda também esteve à frente do Excelente Discos, que lançou o Virgulóides e do Trama Virtual, plataforma de bandas independentes. Depois de ser jurado de programas de novos talentos do SBT, o produtor atualmente é responsável pelo selo Stereomono, que faz parte do Skol Music. Além disso, é curador do projeto Prata da Casa, que acontece toda terça-feira, no Sesc Pompeia, em São Paulo. O espaço é dedicado a novos artistas da música brasileira.

O Ligado à Música conversou com Miranda sobre sua trajetória marcante nos anos 90. O produtor falou sobre aquele momento do rock nacional, também sobre o importante selo Banguela, bandas que produziu e ainda deixou sua opinião a respeito do rock atual. Confira a seguir.

LIGADO À MÚSICA: Miranda, o que você acha das bandas dos anos 90 que misturavam ritmos regionais e populares?

CARLOS EDUARDO MIRANDA: Olha, esse negócio de misturar não é uma coisa dos anos 90, no Brasil sempre foi um caldeirão assim na misturança. Nos anos 60, os Mutantes já faziam isso, a galera lá do Ceará já fazia isso. Os rocks progressivos do Nordeste já faziam isso. Era uma experiência que já viam sendo feita. Nos anos 70, a gente chamava o Alceu Valença de rock, véio. Virou MPB depois. Nos anos 80, continuaram a ter experiências desse tipo com Picassos Falsos, Paralamas, Graforréia Xilarmônica, Fellini, um monte de banda. Nos anos 90, isso foi chegando a um tipo de maturidade e achou uma liga nova. Acho que maturidade nem seria a palavra, na verdade foi uma porra louquice do caralho que foi a coincidência de ter o Raimundos fazendo aquilo em Brasília, juntar o forró com o hardcore; o Chico Science e Nação Zumbi, Mundo Livre, galera do mangue lá em Pernambuco, misturando hip hop com maracatu, um monte de coisas. Era um momento. Mas isso não é o mais marcante da época. Eu acho que o mais marcante da época era acreditar e fazer, ir atrás do que fosse, e conseguir conversar melhor com o país. Acho que isso é mais importante de tudo.

LIGADO À MÚSICA: Como surgiu o selo Banguela?

MIRANDA: O Banguela é fruto da minha vivência como produtor que eu só estava fazendo discos de metal, porque eu era cabeludo, então era metaleiro e fazia discos de metal. E eu era repórter da [revista] Bizz, estava viajando pelo Brasil vendo tudo o que estava acontecendo. Eu ficava enchendo o saco de todo mundo com as minhas demos do Planet Hemp, Raimundos, Charlie Brown, Skank, tudo. Eu atazanava a vida de todo o mundo. E um dia eu fui para o estúdio com os Titãs acompanhar as gravações do “Titanomaquia” para a Bizz. Foram duas matérias especiais, duas edições com eles na capa, maior história legal. E mostrei para eles, porque estavam muito próximos de mim. Muitas vezes, artistas que eu produzia, os Titãs apadrinhavam, tipo o Volkana, ou artistas que eram muito meus amigos como o Moleque de Rua, que era uma galera que batia lata e tal. Também acabou fazendo coisas junto com eles, o Charles Gavin (ex-baterista dos Titãs), produziu e também tocou em show deles. Então a gente estava muito perto. Eu falei ‘po, são uns caras legais que vão entender o que tenho aqui’. E eles foram muito parceiros e toparam na hora, a gente teve a aventura de montar um selo e a gente meteu a cara. E foi assim, uma aventura de doido, véio.

LIGADO À MÚSICA: Como foi produzir o Raimundos?

MIRANDA: O Raimundos foi um disco em uma foto preto e branco, no primeiro disco. Cheguei ali e registrei exatamente como eles eram crus, deixei a areia toda, a porrada toda, a sujeira toda e pau. Já depois, quando fiz o “Só no Forevis” foi um outro momento, aí eu busquei a canção, busquei uma coisa mais de comunicação mesmo. Cada disco é um disco, cada momento é um momento.

LIGADO À MÚSICA: E como foi trabalhar com o Mundo Livre S/A?

MIRANDA: O Mundo Livre foi uma aventura, véio, loucura total. A gente quase quebrou o selo, nos aventuramos no estúdio que era o que o disco pedia, um disco experimental. A gente chegou e ‘vamos enlouquecer, vamos pirar’. Eu sou muito feliz com o resultado e avaliando hoje, olhando para traz, não foi tanto tempo assim, foram 660 horas. Um disco bem feito hoje em dia se gasta quase isso, cara. Então foi uma experiência louca porque era um estúdio caro, né. Era com fita, era mesa, mas foi um dos melhores momentos da minha vida.

LIGADO À MÚSICA: E com o Virgulóides?

MIRANDA: O Virgulóides foram dois palitos. Chegou ali, um, dois, três, gravando. Tchau!

LIGADO À MÚSICA: Como você vê o rock atualmente?

MIRANDA: O rock está uma bosta e só tem um monte de roqueirinho que só quer ser da Globo. Rock de verdade está aí tudo pervertendo pelos cantos. Mas no final, tudo é rock né, véio? O hip hop é rock, rap é rock, tudo é rock hoje, porque sei lá, esse negócio de rock, papo de véio do caraio (risos).