La Raza fala sobre carreira e a missão de tocar com Limp Bizkit

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Foto: Reprodução

O La Raza subirá ao palco do Espaço das Américas, em São Paulo, nesta quinta-feira (26) de feriado, para abrir o único show do Limp Bizkit no Brasil. Formada em 2007, a banda está de volta reformulada, no entanto, mantém a postura contestadora. O primeiro single do novo trabalho, intitulado “/Quem” acaba de ser lançado, e os caras prometem mostrar ao vivo. “Antes você mostrava seu RG, você tinha uma identidade. Agora você é o Facebook/alguma coisa, você é o Twitter/alguma coisa, você é o Instagram/alguma coisa”, disse o vocalista Alex Palaia sobre a composição da faixa.

Em entrevista exclusiva ao Ligado à Música, Palaia falou sobre a trajetória do La Raza que iniciou tocando com bandas do circuito emo e se destacou pelo som mais agressivo. O vocalista também relembrou de importantes shows com New Found Glory e P.O.D. Além disso, comentou a respeito da responsabilidade de tocar ao lado do Limp Bizkit e aproveitou para criticar a falta de apoio ao rock nacional: “A galera no Brasil reclama que não tem apoio no rock nacional, mas quando uma banda tem a oportunidade de se apresentar nessas circunstancias acha que não está bom, então fica difícil entender o que o povo quer”. Confira a seguir o bate-papo.

LIGADO À MÚSICA: Como surgiu o La Raza?

ALEX PALAIA: O La Raza surgiu em 2007. Muitas pessoas me perguntavam porque eu não tinha banda mais. Eu tive bandas quando era mais novo, naquela época que eu andava com o pessoal do bairro do Ipiranga, Seks Collin, Biscoito, esses caras, e fazia participações com a galera. Então pensei em mantar uma banda também. Fui juntando umas pessoas que eu achava que eram bacanas e aí a gente montou o La Raza despretensiosamente no primeiro momento.

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Raimundos Rock Fest (Foto: Reprodução)

LIGADO À MÚSICA: Você buscou influências de quais bandas?

ALEX PALAIA: Eu sempre busquei por rock pesado e rap. Então eu procurava referências nesses dois mundos assim que casassem de uma forma para atender o som que a gente queria fazer. Coisa mais grooveadas como Red Hot Chili Peppers, Primus, 311, uma banda que a gente escutava muito quando montamos o La Raza, também Rage Against The Machine e Limp Bizkit. As duas últimas são bandas que eu falo brincando que a gente comia com farinha (risos). Faziam parte do cardápio diário de bandas que a gente escutava. Outras coisas mais underground, tipo Hed PE, que é uma banda não muito grande no Brasil, mas nos Estados Unidos é bem popular. Tem até o vocalista que é brasileiro, o Jared Santos, ele canta até umas coisas em português no meio da música, e Beastie Boys, Cypress Hill, A Tribe Called Quest, essa leva de rap a gente ouvia pra caralho. Além de Sabotage, Racionais, RZO, Facção Central, essas coisas mais antigas. Então a gente estava sempre ali, curtindo esses dois mundos. E a banda se destacou um pouco na época porque era bem no tempo que estava rolando o lance do emo. Eu cara mais novo e na época falava uma par de bosta. Essas bandas que hoje não existem mais tipo Hevo84, Cine, eu falava que era tudo uma bosta. Teve até um show que a gente foi fazer em Campinas com o Fresno, Hevo84, o Cine acho que iria tocar também e outras bandas locais. E era legal porque a gente tinha tocado já em Campinas antes e o Hevo iria tocar, mas deu um problemas e eles não foram. Então nós fomos a última banda a tocar, era em uma casa para 400 pessoas e foi do caralho. E aí quando o contratante foi fazer outro show em um lugar grande, que era o Campinas Hall, ele chamou a gente. Quando chegamos na cidade os moleques falaram “caralho, olha os caras do La Raza”. Então a molecada começou a enxergar a banda como uma coisa diferente. Dentro de um cenário que estava acontecendo, a gente era os ETs ali. Ninguém tinha cabelinho, ninguém tinha calça apertada e chegava no show, o bagulho era pressão monstra. Esses dias eu até postei umas fotos desse show, os seguranças paravam o show umas duas vezes. Pediram para segurar a molecada porque foi dito que era um show de rock feliz, que a molecada ficaria com a mão para cima. O coro estava comendo, e que era legal, maior rock n’ roll isso aí. Então nessa época, a gente falou “foda-se, vamos tocar com todo mundo, sem distinção de estilo dentro do rock e de outros rolês”. Porque a gente gosta de rap, de reggae, de dub, de música eletrônica. Então acho que uma das coisa que contribuiu para que a gente tenha feito coisas legais em um curto espaço de tempo, dessa primeira fase, foi justamente isso. Ah, vai ter um show com NX Zero, vamos. Ah, vai ter um show com o Dead Fish, vamos. Vai ter um show com a Pitty, vamos. A gente tocou em uma semana com o New Found Glory e na outra com o P.O.D., para públicos totalmente diferentes.

LIGADO À MÚSICA: Como foram os shows com essas bandas internacionais?

ALEX PALAIA: Cara, no show com o New Found Glory foi até curioso, porque lembra do festival ABC Pró HC?

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Show em Campinas (Foto: Reprodução)

LIGADO À MÚSICA: Lembro, de São Bernardo.

ALEX PALAIA: Rolava no ABC, mas essa foi a última edição, inclusive. Eu acho até que o La Raza contribuiu para o término desse evento. Porque, essa edição foi no Ginásio do Palmeiras e iria ter várias bandas legais. Não lembro se o Dead Fish iria tocar, mas teve Garage Fuzz, Envydust, e também o New Found Glory pela primeira vez. A gente já estava em uma ascensão legal e iria tocar em um determinado horário e até hoje, por uma razão que eu não sei, mudaram para outro horário. Acho que justamente porque eu dei umas entrevistas meio que controversas, acho que algumas bandas desse segmento mais pop, emo, bla bla blá, que estavam muito mais fortes do que a gente devem ter reclamado. Então quando a gente chegou lá no dia, de repente a gente que iria tocar às 6 da tarde, colocaram para tocar à 1 da tarde. Eu fiquei puto, cara, fiquei louco! Aí eu fui atrás do promotor, um cara que sumiu, nem faz mais eventos. Eu pensei: “Beleza, esse filho da puta não vai aparecer? Deixe comigo”. Sorte que quando a gente chegou já tinha uma galera para ver a gente. E assim, desde o começo, o La Raza nunca pagou para tocar, nunca vendeu ingresso e sempre foi totalmente contra esse tipo de coisa. E eu sabia que esse promoter na época se cresceu botando as bandas para tocar vendendo ingressos. Aí eu falei: “Quer saber, que se foda. Eu nunca mais vou tocar com esse cara de novo. Então foda-se”. Antes do primeiro acorde do show, eu peguei o microfone e falei para aquela galera: “A parada é o seguinte, esse filho da puta aí mudou a gente de horário… você que tem banda não paguem para tocar”. Falei uma par, joguei um monte de merda no ventilador. Falei o nome do cara, intimei para ele aparecer. E ainda disse: “Enfia esse festival no cú, nós somos o La Raza”. A galera pirou.

Eu não vou me corromper por uma coisa que não concordo, que não gosto de fazer. Tudo bem que eu sei de momentos que precisa se adequar a algumas necessidades de ocasião, mas se for uma coisa assim muito bizarra, eu não vou fazer. Você tem que manter o que você é, porque se você abre as pernas uma vez, depois não tem mais volta. Eu vi muitas bandas que acabaram se perdendo nesses rolês. Por trabalhar com produção, vi bandas que ficaram em uma ascensão muito boa, muito legal, que de repente acabaram caindo porque começaram a fazer coisas que destoavam do que elas se propuseram a fazer quando elas começaram. E aí não tem verdade, né, cara.

LIGADO À MÚSICA: A banda depois disso deu um tempo e você fez um teste com os músicos do Rodox. Como foi essa experiência?

ALEX PALAIA: Quando o La Raza acabou, eu estava de bobeira, sem banda, e em uma convenção de tatuagem eu encontrei o Fernandão, batera e brother das antigas, que agora está com o Worst, tocava no Pavilhão 9. Eu perguntei das músicas, porque tinha muita proximidade com ele o Magal que era guitarrista do Rodox, o Marcão também. Eu sabia que o terceiro disco do Rodox estava gravado, mas não tinha vozes. Eu falei “o que vocês vão fazer com esse negócio”. Então o Fernandão disse: “A gente está fazendo testes com uns doidos. Está afim de ir lá no estúdio? Você está sem banda mesmo”. Aí eu fui gravar com os caras umas demos que ficaram bem legais, inclusive. Só que aí, os caras entre eles, cada um com seu projeto, demorou muito e não foi para frente. Mas foi uma puta experiência legal. Porque foi a primeira vez que eu estava em um estúdio com uns puta monstros músicos profissionais. Os caras gostaram do que eu fiz, então eu estava fazendo alguma coisa certa, eu tinha alguma coisa boa a oferecer para os caras. E somos todos amigos até hoje.

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Foto: Reprodução

LIGADO À MÚSICA: O La Raza depois se formulou. Queria que você falasse dos integrantes atuais.

ALEX PALAIA: Cara, a banda durou dois ou três anos e a gente fez bastante coisas legais em um curto espaço de tempo. Justamente por isso, pelo som que acabou se destacou por ser diferente naquele momento, e acho que também pela postura que todo mundo tinha dentro da banda. E aí acabaram rolando uns problemas internos, de divergência de segmentos, de rumos e tal, e cada um foi para seu canto. A banda acabou e não acabou, sabe aquele término de namoro? Você se afasta da mina e ela de você, mas ninguém virou e disse que acabou. Aí passou todo esse tempo, eu comecei a entrar nesse rolê de produção e senti muita falta de fazer música, de tocar com meus amigos. E aí eu chamei quase todo mundo que estava na banda antes, só mudei o guitarrista. Nosso baixista, que é o Rafael Bombeck, foi para a guitarra. Ele é um psicopata, toca guitarra tão bem quanto o baixo, é um absurdo. O Thiago Matricardi continua na batera. Aí a gente fez um ensaio com o Carlos Nunes, produtor que está se dando super bem com produção de hip hop, música eletrônica e até funk carioca e o Vitão que era um brother nosso como baixista. Essa formação durou apenas dois ensaios, porque o Carlos estava fazendo vários trampos, ele teve uma postura muito legal em dizer que não queria atrapalhar a banda. Continua nosso brother, a gente sai com ele direto. E aí a gente encontrou o Daimon através do Thiago, que é um DJ de Heliópolis, foi um dos primeiros DJs do Sabotage, tocou com o Rappin Hood. E o Juninho, que é um baixista, moleque novo ex-aluno do Heitor Gomes, que tocava no Charlie Brown Jr. e hoje está no CPM 22, galera super brother. Eu falei para o Heitor que precisava de um baixista, então ele me disse: “Mano, tem um moleque que eu criei em laboratório esperando uma banda que nem a sua para soltar esse monstrinho”. Aí ele soltou esse monstrinho na minha mão e no primeiro ensaio, o moleque já comeu a parada, a gente ficou impressionado e rolou. A banda tem que ter isso, né. Nesse ensaio quando rolou, a gente logo falou: “É essa a formação”. Depois a gente ensaiou oito meses meio que escondido, sem avisar ninguém e de repente fomos fazer um show na Clash com Choldra, Reação em Cadeia.

LIGADO À MÚSICA: No Honorsounds Festival, né?

ALEX PALAIA: Isso, e foi maior legal, cara. Foi mais gente para nos ver do que esperávamos. Isso é um puta feedback bom, e desde então estamos fazendo nossas coisas bem devagarzinho, com calma, pé no chão. Estamos fazendo poucas coisas, porém, coisas legais, até que saia o disco. Coisas que tenham destaques, que tenham relevância. Então a gente fez o Hangar 110 em janeiro, em dezembro a gente não tocou, mas fez uma festa e chamou os fãs e amigos para irem nesse local. A gente registrou as imagens dessa festa que a gente tocou, querendo ou não, não deixou de ser um show. Fizemos as gravações para o clipe. Em março a gente tocou no Raimundos Rock Fest, a convite do Raimundos, no Carioca Club. Foi legal pra caralho! Tocar com o Raimundos é maior legal, maior diversão. E agora tem essa missão com o Limp Bizkit.

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Foto: Reprodução

LIGADO À MÚSICA: Vocês estão lançando o single “/Quem?”. Me fale um pouco sobre esse som.

ALEX PALAIA: Esse som é o seguinte: a internet é super útil, super positiva, ela mudou a vida de muita gente, mas também estragou muita coisa ao mesmo tempo. Como tudo na vida tem um lado bom e um lado ruim. Então, antes você mostrava seu RG, você tinha uma identidade. Agora você é o Facebook/alguma coisa, você é o Twitter/alguma coisa, você é o Instagram/alguma coisa. Então você é /alguma coisa. Aí eu comecei a me indagar: “Você é /quem? Quem é você”. Porque na internet, como fala na música, todos se amam e todo mundo é legal, e o maior prazer da vida se tornou banal, que é viver. Então todo mundo tem uma vida perfeita. Só que quando você vai ver por trás do computador o cara está maior mal, duro, maior perrengue, depressivo. Não é todo mundo, mas eu vejo muito disso. Não generalizo, mas a grande maioria tenta vender algo que não é na real. É uma crítica, mas é também uma tiração de sarro. Tipo “você é maior otário, cara” (risos). Vamos viver, vamos curtir. Nos shows quando a gente vai tocar essa música eu falo brincando se é mais legal você ficar jogando Counter Strike na internet, que não é ruim, cara, mas existem formas diferentes de você se divertir, mas eu prefiro mil vezes jogar uma bola com meus amigos, jogar uma sinuca, sentar em um boteco e trocar ideia com meus amigos. A molecada fica nessa “manda nudes, entra no Skype, fica peladinha para mim”. Vai transar, mano, transar é maior bom, tá ligado? Então, tem um pouco disso de não ter mais a verdade ali de viver, vivenciar as coisas. Eu falo isso, vamos curtir. Tem uma expressão que todo mundo fala brincando: “Se organizar direitinho, todo mundo transa”. Se organizar direitinho, todo mundo vive, se diverte, cara. Com essa música, eu quero fazer as pessoas saírem um pouco dessa bolha. Legal, cara, eu mexo com computador pra caralho, eu dependo da internet pra trabalhar. As vezes estou de saco cheio e quero ver um filme no Netflix, mas eu acho que as pessoas estão ficando muito em sua bolha. Uma das coisas que me inspirou fazer essa música foi um dia que eu assisti depois um bom tempo o clipe “Do The Evolution”, do Pearl Jam. E aí eu estava nessa piração do tema e vi o clipe. Esse é um vídeo de 1998, e a gente está em 2016, brother. São 18 anos e está mais bizarro e a tendência é piorar. Você vê as pessoas fazendo uma piada do tipo “o WhatsApp parou e a mãe encontrou o filho que não vê há três anos dentro de casa”. É uma piada engraçada, mas tem algo muito errado quando isso vira uma piada. Como as pessoas vão se relacionar assim? É mais ou menos sobre isso que a música fala.

LIGADO À MÚSICA: Além do single, vocês estão gravando o disco. Como está esse processo?

ALEX PALAIA: São dez músicas, a gente está gravando o disco no Family Mob, na Lapa, estúdio muito bacana que tem o projeto Converse Rubber Tracks.

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LIGADO À MÚSICA: Vocês participaram?

ALEX PALAIA: A gente participou. O primeiro dia de gravação foi dentro do Converse Rubber Tracks, que o Thiago, nosso bateria, gravou as dez músicas em uma paulada só. É o estúdio do Jean Dolabella, do Diesel, ex-Sepultura, e agora está com uma banda super bacana que é o Ego Kill Talent, amigos nossos também. E estamos aí gravando as guitarras, gravamos os baixos. Na verdade, o plano original era gravar o disco com bastante calma, com tranquilidade. A gente optou por agilizar duas músicas em função do show com o Limp Bizkit, em tocar e não ter nada lançado. Até tem uma molecada mais nova que não conheceu a banda da outra fase falando “po, os caras vão tocar, mas não tem nada gravado”. Na outra fase, a gente chegou a gravar um disco que não foi lançado, ficou na gaveta porque a gente iria lançar por um selo e por questões burocráticas, passou os direitos e a gente não pode mais lançar as músicas. Tudo que estava na internet teve que ser tirado. Mas é aquela coisa, quem já conhece a banda, quando soube voltou a acompanhar, e a gente está buscando trabalhar para que essa galera mais nova venha conhecer a gente. A gente tem procurado estar bem presente nas redes por mais que na outra música a gente fale uma coisa, a gente tem procurado estar na rede para explicar que a banda já existia antes e não caiu de paraquedas. Inclusive era pra gente ter tocado em 2011, mas a banda acabou antes.

LIGADO À MÚSICA: E qual a expectativa desse show com o Limp Biskit?

ALEX PALAIA: Cara, é da hora, né (risos). É a mesma expectativa de tocar com o Raimundos. É uma banda que você gosta pra caralho, que você ouviu muito em uma fase da sua vida, te marcou pra caramba. Nesse caso, a pressão é maior, os fãs são mais exigentes. Eu mesmo sou chato com as bandas que gosto. Então é uma missão, né. A gente passou por isso quando abriu para o P.O.D., apesar de que na época muitas pessoas já conheciam a banda. A galera no Brasil reclama que não tem apoio no rock nacional, mas quando uma banda tem a oportunidade de se apresentar nessas circunstancias acha que não está bom, então fica difícil entender o que o povo quer. Não tem apoio, mas também os que reclamam que não tem apoio não apoiam quando um irmão ou uma entidade, que é a banda, precisa do seu apoio. É difícil você manter uma cena viva, um movimento vivo, se aqueles que reclamam da falta desse movimento não contribui para que ele ocorra. Mas a gente vai subir lá e botar pra foder. Quem gostar, gostou. Quem não gostar, foda-se. É bem assim a nossa postura. Se não gostou, foda-se, vai lá tomar uma breja. Ninguém é obrigado a gostar. De verdade, não estou colocando uma arma na cabeça para gostarem da minha banda. Se gostar, seja bem-vindo, agora se não gostar, foda-se, mas vamos ali tomar uma breja, discutir sobre som. Não é porque não gostou da minha banda que não podemos ser amigos. Porque a galera fica maior ofendida, não se pode mais falar o que pensa.