Serguei: ‘Igual ou pior do que a ditadura militar é o ‘sertanojo’ no Brasil’
A lenda viva do rock brasileiro Serguei acaba de ser homenageado com o DVD duplo “O Anjo Maldito do Rock Brasileiro”. Produzido de forma independente pelo cartunista Marcio Baraldi, é o primeiro material oficial em vídeo do artista de 81 anos, sendo 50 deles dedicados ao rock n’ roll. O DVD faz um apanhado de sua carreira e conta com depoimentos de diversos artistas nacionais, entre eles, João Barone (Paralamas do Sucesso), Ritchie, George Israel (Kid Abelha), Oswaldo Vecchione e Celso Vecchione (Made in Brazil), Dr. Silvana, Arnaldo Brandão (Hanoi-Hanoi), Renato Ladeira, Marcelo Sussekind e Roberto Lly (Herva Doce), Fernando Magalhães, Rodrigo Santos e Guto Goffi (Barão Vermelho), integrantes do Pandemonium, entre outros. O cantor é lembrado com carinho e respeito pelos entrevistados. Muitas historias são lembradas no vídeo, como o clássico romance com a cantora Janis Joplin contado em detalhes por pessoas próximas ao artista. O DVD ainda vem com um bônus contendo raridades de apresentações do músico e participações em programas de TV ao longo de sua carreira.
O lançamento do material aconteceu no fim de junho na loja Baratos Afins, em São Paulo. O próprio Serguei fez questão de estar presente. O Ligado à Música esteve no local e bateu um papo com o cantor sobre o DVD: “Os momentos mais importantes da minha vida, ele [Baraldi] colocou nesse DVD. Então fica o meu agradecimento imenso a ele. Sabe como é a vida do rock n’ roll, né? E sempre ele chega junto pra dar uma força”, agradecendo ao Baraldi pelo trabalho produzido. E continuou: “Como você vê, é de extremo bom gosto. Adorei a ideia, agradeço a Deus e agradeço a todas as pessoas que lembram de mim, e que acompanharam a minha carreira nos 50 anos de estrada. Pelos 81 anos, não me diz nada a não ser de muita alegria e muita intensidade. Sempre tive uma vida muito intensa. Não tenho do que reclamar, que nem dizia minha mãe. A única coisa que reclamo é não ter mais a Dona Maria e Seu Gustavo hoje”.
O idealizador do projeto, Marcio Baraldi, também estava no evento e deu mais detalhes de como foi produzido a homenagem ao artista: “Tomei a iniciativa porque o cara está com quase 82 anos de idade e não tinha um DVD até hoje, sacou? Ninguém se interessou em fazer, o que eu acho uma puta de uma injustiça. Então eu falei ‘antes que ele bata as botas, deixa eu fazer alguma coisa por ele’. Eu mesmo tirei dinheiro do meu bolso, não tenho patrocínio nenhum. Eu sou fã do Serguei e paguei 100% do meu bolso. Paguei câmeras, paguei as viagens, paguei prensagem, paguei tudo”.
Baraldi comentou da década de 1980, quando o rock brasileiro explodiu. Ele se recordou que de as gravadoras deram oportunidades para várias bandas, mas não investiram no Serguei: “Quando teve aquele boom do rock nos anos 80, muita gente ganhou grana, mas ele não ganhou. Mas, ao mesmo tempo, ele foi um cara que nunca saiu dos palcos. Apesar de não ganhar grana com venda de discos, ele foi um artista de palco a vida inteira. E os shows do cara eram muito bons, porque ele é energia pura, saca?”. O cartunista também falou que o cantor era indisciplinado nas finanças, porque o negócio dele sempre foi o palco: “Para você ver, com essa idade ainda está no palco. Quantos roqueiros no mundo tem essa coragem? Quantos tem pique que encarar um palco ainda?”.
Voltando ao DVD, Baraldi teve a ajuda de Luiz Calanca, da Barato Afins, para organizar a discografia do “dinossauro do rock brasileiro”, que está nos extras e falou mais sobre o material bônus: “O Luiz Calanca me ajudou muito com os compactos raríssimos difíceis de achar. Está tudo ali, não faltou nada. Tem uma galeria de fotos com todas as idades do cara, desde um ano de idade, os pais dele, então está bem completo. O disco dois é um bônus disc com vários shows da carreira dele. Tem o show dele com o Celso Blues Boy no Circo Voador, em 1982, maravilhoso o show, histórico! Tem o show com o Cerebelo, banda que foi muito importante nos anos 80 e tocou com ele no Rock in Rio. Banda do Marcelo Xavier que compôs vários hits dele que toca até hoje. Tem programa dele no Jô Soares. Tem ele no Rock in Rio 91, apresentação maravilhosa, histórica, cara. Ele fez todo mundo sentar enquanto cantava. Pô, quantos caras conseguem fazer isso, saca?”. Baraldi demonstrou estar realizado pelo lançamento de “O Anjo Maldito do Rock Brasileiro”: “Deus me livre, mas se o Serguei morrer amanhã, está bem registrado. Antes tarde do que nunca, mas ele merecia ter esse reconhecimento com um apanhado de toda a carreira dele. De quebra ainda vem um pôster bonitinho”.
O cantor tem uma longa bagagem de vida no cenário musical. Viu nascer a indústria, conheceu artistas importantes do rock mundial e acompanhou a evolução do mercado fonográfico. O momento atual da música brasileira é algo que o incomoda: “Eu acho que igual ou pior do que a ditadura militar é o ‘sertanojo’ no Brasil. Primeiro lugar, eu não sei que diabo é sertão. Eu não sei. Sou garoto de Copacabana, Ipanema, Leblon e Lapa. Isso aí não diz nada. O pessoal do sertão, da roça, tudo cantando… a única coisa boa é Inezita Barroso, mas aí é até um insulto à música no Brasil em comparar com esse ‘sertanojo’ com a autenticidade, a beleza, o brilho de Inezita Barroso”.
Ele ainda criticou o rock atual: “Praticamente inexistente se você for comparar com o rock n’ roll, é um horror. Uma amiga minha americana chegou agora lá em casa e eu falei: ‘E a música nos Estados Unidos, o rock e a música?’. Ela falou: ‘Serguei, música? Não existe música mais’”.
Serguei terminou o papo falando a respeito da velhice, e também sobre a entrega no palco: “Esse negócio de idade, a melhor idade, é tudo uma coisa falsa, forjada, nojenta. Porra nenhuma. A velhice é uma merda. Minha prima estava conversando comigo e não tirava o olho daquela foto que foi Miss Brasil. Linda, um sonho. Aí ela olhava assim e falou: ‘É Serguei, vou te contar, olha lá, a velhice é uma merda’. Então, eu não me toco disso, porque eu vou pro palco e… música popular, blues, é a emoção. Cantar qualquer um canta, desde que tem uma afinação e uma voz boa. O cantar popular é uma entrega”.
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